Entrevista de Domingo
Ele vê no exemplo a maior contribuição que um pai pode dar aos seus
Por Maurício Juvenal - Redação BS9
08/08/2021 - domingo às 07h00
Antonio Juvenal nasceu em Olinda (PE), na década de 30; aos 23 anos veio para o Sudeste - (foto: BS9)
Ele nasceu em Olinda, Pernambuco, na segunda metade da década de 30. Aos 23 anos, em busca de uma vida melhor, como tantos outros nordestinos veio para o Sudeste, instalando residência em Cubatão, após passar por Minas Gerais e pelo Rio de Janeiro. Trouxe, além de duas pequenas malas, a esposa e a filha recém-nascida, com apenas 40 dias de vida.
O primeiro trecho da viagem foi graças a um caminhoneiro solidário que transportou a família, dividindo o espaço apertado da boleia, até Minas. De lá, um trem os levou ao Rio, onde permaneceram por cerca de dois anos, quando então rumaram para Cubatão, que anos mais tarde se tornaria um dos principais polos industriais do País.
Motorista profissional dos bons, dirigiu caminhões, ônibus e peruas, as tradicionais kombis, transportando trabalhadores que atuavam nas fábricas da cidade. Perdeu a conta de quantas caçambas de areia carregou a partir do Porto de Areia de Cubatão, no caminhãozinho que, com muitas dificuldades, conseguiu adquirir, algo que marca sua história e sua vida até hoje. Trabalhador e dedicado, foi convidado então para atuar na Carbocloro S/A Indústrias Químicas, uma multinacional importante, onde permaneceu por longos 31 anos, até se aposentar.
A primeira casa própria, localizada na rua Padre Primo Vieira, 151, Jardim São Francisco, foi construída exclusivamente com os braços e suor dele e da esposa, tijolo a tijolo, lata a lata da mistura de cimento, areia, brita e água. E a vida correu, andou e, hoje, aos 85 anos, ele é chamado de pai pelos sete filhos que a vida lhe deu, e, também, por um oitavo, o primeiro de todos e fruto de um relacionamento anterior, que dos céus celebra o dia desse pai que também é meu, e que tenho a felicidade de entrevistar
1- Depois de oito filhos já criados, acho que o senhor reúne todas as condições de me dizer o que é ser pai. Estou certo?
Eu acho que sim, meu filho. E talvez você mesmo possa e saiba responder melhor do que eu a essa pergunta. É a melhor coisa do mundo, sem dúvida alguma. É a melhor e a melhor coisa do mundo. É participar do início de uma vida, é a prova da existência de Deus, é uma benção nas alegrias e nas tristezas, na vitória dos filhos e também nas derrotas. Nos sucessos que cada um deles obtém, como nos tropeços que leva. E pensa que eu vivo isso há seis décadas. Só tenho a agradecer.
2- São oito filhos, oito vidas, oito experiências. O senhor planejava ter tantos filhos?
Não sei. O que sei é que se a idade não tivesse chegado acho que nós não teríamos parado, eu e minha senhora. É resultado de muito amor, sabe. Então, nunca fizemos conta. Eu penso que faria sete ou oito de novo. Aliás, eu gostaria muito que todo pai tivesse os sete filhos que eu tenho. Nenhum dos meus filhos me deu ou me dá trabalho, a não ser o normal, as preocupações comuns que todo pai tem e em todas as fases da vida. A gente é pai o tempo todo. Tenho filho médico como tenho filho motorista de ônibus, e todos com muita saúde, mas, sobretudo, com muita decência, com uma ficha de vida que só me dá motivos para ter orgulho. Tenho um filho que é professor e ex-seminarista, o que eu poderia querer mais?
3- Tem também um jornalista, que só dá dor de cabeça, um caso à parte, afinal de contas não dá para não ter a ovelha negra da família (risos). Pai, qual é a melhor e a pior parte em ser pai?
A melhor é ter todos eles bebês, e a pior é que eles crescem. E quando crescem, e quanto mais crescem, tornam tudo mais difícil. A gente perde as rédeas sobre a vida dos filhos e isso dá uma certa angústia. Não é para ter o controle absoluto, mas enquanto temos as rédeas, temos mais condições de socorrer, de apoiar, de estar próximo, de dizer ou orientar sobre como fazer. Se há de fato uma parte ruim em ser pai, é exatamente essa que estou dizendo.
4- Todo esse tempo como pai e as tantas experiências que a vida se encarregou de propor ao senhor, em algum momento teve medo ou preocupação em não dar conta?
De não dar conta, confesso que não. Jamais. Muito também pelo apoio e dedicação que, minha senhora, sempre me deu, estando sempre ali ao meu lado e, muitas vezes, até tomando à frente das situações. Me ajudando o tempo todo e em todos os sentidos. Sentada horas e horas em uma máquina de costura para que pudéssemos vencer na vida, enquanto eu me revezava em dois ou três trabalhos simultâneos. Deus sempre foi muito bom com a gente e, apesar de termos passado períodos apertados, nunca deixamos faltar nada para as crianças. Medo ou preocupação só com o mundo lá fora, com aqueles assuntos e riscos que não podemos ou conseguimos controlar, como a violência e as drogas. Acho que vivi um tempo em que era mais fácil ser pai do que é hoje. Tive essa sorte.
5- O senhor acha que é um pai melhor do que o pai que o senhor teve?
Perdi meu pai, seu avô, muito cedo. Eu tinha apenas sete anos. Não sei dizer, mas sei que mesmo aos 85 anos lamento muito por isso, sinto falta dele (respondeu emocionado).
6- E no ponto de vista do senhor, qual sua maior contribuição na vida dos seus filhos?
Sem falsa humildade, o exemplo. São 85 anos onde não dei o direito de qualquer pessoa ou autoridade chegar perto de mim e dizer, por exemplo, “você está preso”. Jamais abri mão, mesmo nos momentos mais difíceis, e não foram poucos, da verdade e da honestidade. E os filhos acabam percebendo e sentindo isso e sei que procuram seguir o exemplo do pai. Penso que nossa maior e principal missão é a de sermos exemplo.
7- Bom, pai de oito filhos, por vezes tem que enfrentar perguntas complicadas. Conta para mim, qual foi a maior alegria de ser pai?
Não tenho dificuldade em responder isso não. É algo que me dá um orgulho danado até porque a sensação é de vitória, de missão cumprida, para mim e para toda a família. No Brasil, não é todo dia que um operário consegue formar uma filha médica. Tenho o maior orgulho dela, mas, antes de tudo, sou grato a Deus, a minha senhora, e aos meus outros filhos por terem me permitido isso. É muita benção.
8- O senhor é quase doutor na arte de ser pai, afinal de contas são oito. Talvez pós-doutorado em “paisofia”. Qual o conselho para quem já é pai e também para quem está pensado em ser?
Para quem já é, que siga o meu exemplo (fala sorrindo) e seja exemplo para seus filhos, em todos os aspectos: ser fiel à honestidade, ser fiel à família, ser fiel ao trabalho. Para que ainda não é, mas está disposto de verdade a ser, que o faça o quanto antes. Na minha opinião, a gente só se realiza plenamente sendo pai, seja de um, de dois ou mesmo de oito filhos.
9- Uma curiosidade que todo mundo tem, mas que fica assim meio desconfortável de perguntar. E quero que o senhor fique bem à vontade. O senhor ama mais um filho do que o outro? Tipo aquele que entrevista melhor e coisa e tal...
O amor é absolutamente igual. Totalmente igual. A gente aprende a lidar com as carências e qualidades de cada um, e se encanta e se apaixona por todos eles. E são processos de aprendizagem, sobre a forma de amar, totalmente diferentes, mas como a mesma intensidade. Não tem essa de amar mais um e menos o outro. Pode ficar tranquilo, meu filho.
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