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Ainda não conseguimos mudar a chave emperrada

Deraldo Silva - Coordenador da Central Única das Favelas (CUFA) na Baixada Santista

Deraldo Silva

13/10/2021 - quarta às 16h27

Gostaria de escrever sobre o projeto Reciclando Sonhos. Na nossa sede, no Japuí, em São Vicente, recebemos celulares e aparelhos eletroeletrônicos antigos ou quebrados. Esses produtos que seriam descartados de forma incorreta, trazendo danos ao meio ambiente e até à nossa saúde, lá são separados e as peças revendidas, gerando renda para quem está inscrito no projeto.
 
Gostaria de escrever sobre o projeto CUFA Empreende, que transformou a vida de Ywanda Ariane. Desempregada, no auge da pandemia, procurou o curso de designer de sobrancelha, se qualificou com a última parcela do seguro-desemprego e abriu o próprio negócio.
 
Gostaria de escrever sobre a horta comunitária do Pixoxó, nosso líder da CUFA Praia Grande. Mandou as fotos da colheita feita há poucos dias. Verduras e legumes fresquinhos, orgânicos, vão para a mesa das famílias que colocaram a mão na terra. A ideia é organizar uma cooperativa, vender a produção e dividir o lucro.
 
Gostaria de escrever sobre outras tantas iniciativas para geração de renda nas comunidades. Afinal a CUFA nasceu para ocupar esses territórios marginalizados e dar visibilidade para as favelas. Colocar em pauta nossas potências, nossos empreendedores, artistas e escritores, mas não dá.
 
Ainda não conseguirmos mudar a chave emperrada por uma economia em crise, aumento do combustível, energia elétrica e gás de cozinha.
 
Vou retomar uma história que pode estar acontecendo agora, enquanto você lê este artigo, em uma das mais de 190 favelas da nossa região.
 
Geisa Sfanini, de 32 anos, morreu após ter 90% do corpo queimado enquanto usava álcool combustível para cozinhar, no cômodo alugado na Grande São Paulo. Ela deixa um filho de oito meses. O bebê também sofreu queimaduras em 18% do corpo, mas se recuperou e está morando com o pai.
 
Segundo relato da dona do imóvel, Geisa passava por dificuldades financeiras e estava sem dinheiro para comprar gás de cozinha.
 
Há algumas semanas, a jornalista Natuza Nery chorou ao comentar sobre as pessoas que passam fome no Brasil e afirmou: “Nós não vamos dar certo. Não tem como o Brasil dar certo se essas pessoas não tiverem trabalho e o mínimo de dignidade,  condição de alimentar os filhos.”
 
Choro ao relembrar a tragédia de Geisa. A história me comove e motiva a continuar nosso trabalho atrás de recursos, doações e cestas básicas.
 
Não sei se o caro leitor se deu conta, mas o símbolo da CUFA é um pássaro anu preto. A ave estigmatizada como prenúncio de mau agouro foi ressignificada, voa carregando esperança.

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