Quinta, 10 de Julho de 2025

DólarR$ 5,53

EuroR$ 6,46

Santos

21ºC

AVANÇO DA DIREITA

Eleição interrompe plano de Macron de liderar a Europa

Convocar eleições parlamentares antecipadas é a jogada mais arriscada de seu mandato.

Robson de Castro

11/06/2024 - terça às 15h00

IGOR GIELOW

Emmanuel Macron foi dormir no sábado (8) com sua autoimagem de líder de uma França renovada à frente da Europa lustrada. Havia comandado as festividades dos 80 anos do Dia D, recebido o americano Joe Biden com pompas e até doado caças para a Ucrânia combater seu arquirrival Vladimir Putin.
O domingo (9) da eleição parlamentar europeia lhe garantiu sonhos intranquilos, reduzindo o presidente à condição algo pedestre de político nas cordas. Convocar eleições parlamentares antecipadas é a jogada mais arriscada de seu mandato.
Pode dar certo, por óbvio, mas a votação consagradora da RN de Marine Le Pen sugere que a busca de uma imagem moderada para a filha do homem que simbolizou a ultradireita fascistóide europeia por décadas está dando certo.
Macron faz, com a eleição, uma última tentativa de colocar o espantalho ante os franceses. Mesmo que Le Pen não amealhe uma maioria, como pesquisas indicam, ela pode sair com mais poder, obrigando o presidente a coabitar com um Parlamento ainda mais hostil a ele.
Desde 2022, Macron não tem maioria, governando por meio de um controverso dispositivo que o permite driblar votações. Ele tem mandato até 2027 e não pode mais disputar a reeleição, arriscando virar um pato manco se a ultradireita ficar em posição de força —potencialmente colocando Le Pen perto do Palácio do Eliseu.
Em 1997, Jacques Chirac também dissolveu a Assembleia Nacional e foi obrigado a engolir cinco anos de coabitação com a maioria de esquerda. Quando o pleito presidencial de 2002 chegou, contudo, o premiê socialista Lionel Jospin foi tirado do segundo turno por Jean-Marie Le Pen, pai de Marine.
O impopular Chirac então surfou o pânico que emergiu no eleitorado francês e reelegeu-se com facilidade no segundo turno. Essa parte da história Macron não poderá testar, dado que está no seu segundo mandato.
Com tudo isso, Macron vê seu plano de tornar-se a referência da Europa, ocupando o posto que deveria ser do cinzento premiê alemão, Olaf Scholz, abortado para tratar de questões mais urgentes em casa. O sistema dual francês ainda dá muito poder ao presidente, mas sua credibilidade saiu bastante arranhada.
Neste ano, o francês tomou para si o papel de principal rival de Putin e sua guerra. Sugeriu enviar tropas para Kiev e aumentou a ajuda militar no momento em que os Estados Unidos titubearam. O russo não se fez de rogado, lançou mão de exercícios de ataque nuclear e retórica inflamada. Não por acaso, o Kremlin disse nesta segunda (10) que acompanharia com interesse a eleição antecipada.
Até como um boxeador pronto para a briga o midiático Macron se vendeu, numa postagem de internet. Em vez de Putin, quem acertou-lhe um cruzado acabou sendo Le Pen, e o título de campeão europeu da temporada poderá acabar nas mãos improváveis de Giorgia Meloni.
A premiê italiana serve de modelo para Le Pen, aliás: surgiu como uma ameaça de ultradireita, cercada por radicais, e moderou bastante suas posições. Para quem temia um rompimento eurocético da sempre turbulenta Itália, Meloni entregou previsibilidade e até se opôs a Putin, visto com bons olhos no seu círculo de aliados.
Le Pen, que já teve associações obscuras com o Kremlin sob escrutínio, por sinal também distanciou-se do presidente russo nos últimos anos. Sua colega italiana, cujo partido liderou a votação italiana para o Parlamento Europeu, agora é a peça central para determinar a permanência ou não de Ursula von der Leyden à frente do braço executivo do bloco, a Comissão Europeia.
No mais, o pleito decantou o momento de ascensão da ultradireita pelo continente, embora isso precise ser temperado com particularidades locais. Ainda assim, a ultradireita se consolidou em locais como Hungria e Áustria e avançou na Espanha.
Pela evidente associação histórica com o nazismo, o caso mais chamativo é o da AfD (Alternativa para a Alemanha, na sigla germânica). Além do segundo lugar no pleito europeu, a AfD deve ganhar em pelo menos 3 dos 8 estados que tiveram eleições locais.
O partido se alimenta de votos de protesto, não por acaso vencendo nas regiões da antiga Alemanha Oriental, mais pobres. O extremismo da AfD é mal disfarçado, tanto que nesta segunda vários candidatos radicais foram retirados da lista do partido para evitar impugnações, assim como a simpatia de vários de seus integrantes pela Rússia.
O fenômeno vale, em menor escala, do outro lado do espectro político. Um micropartido criado em janeiro a partir de uma costela do A Esquerda, a BSW (Aliança Sahra Wagenknecht na sigla alemã, batizada em homenagem à sua líder), ficou em quinto lugar nacional, com 6% dos votos projetados.
A BSW é uma salada de frutas ideológica: é de extrema esquerda econômica, ultraconservadora nos costumes, anti-imigração, contra políticas verdes e russófila, lembrando a admiração que Putin gera em setores da esquerda brasileira. Mais do que tudo, é um partido antissistema, como a AfD.
Ainda na Alemanha foi visto o derretimento do Partido Verde, que perdeu espaço em toda a Europa e voltou ao patamar de representatividade de 2014 no Parlamento Europeu.
Isso significa desafios adicionais à ambiciosa agenda de redução de emissão de carbono do bloco, que quer zerar a conta em 2050, e mostra a eficácia do discurso da ultradireita para o chão de fábrica no continente.
Por fim, como um nada menosprezível prêmio de consolação a quem preza estabilidade, resta evidente que, apesar dos impactos locais dos ventos eleitorais, a centro-direita segue firme no leme europeu.

 

FOLHAPRESS

Deixe a sua opinião

Leia Mais

ver todos

EDUCAÇÃO

Governo lança programa Na Ponta do Lápis, voltado à educação financeira de alunos do ensino básico

ASSISTÊNCIA SOCIAL

Governo Federal amplia público prioritário do BolsaFamília

DIA DA PIZZA

Comemorado em 10 de julho, data representa oportunidade de ouro para bares e restaurantes aumentarem

2
Entre em nosso grupo