HANSENÍASE
Brasil está no topo do ranking de países com mais casos de hanseníase, doença milenar que tem cura, mas os pacientes são tratados com a mesma medicação (coquetel de antibióticos) há 4 décadas
Da Redação
05/05/2025 - segunda às 15h00
A racionalidade no uso de medicamentos não se limita à prescrição consciente, mas também à urgência de substituir esquemas terapêuticos obsoletos e desenvolver novas opções farmacológicas para a hanseníase. - ADOBE STOCK
A hanseníase permanece como um desafio de saúde pública global, especialmente em países tropicais. O Brasil, infelizmente, está no topo do ranking mundial da doença como o segundo país em quantidade de casos, atrás apenas da Índia. Além de inúmeros desafios para a eliminação da doença como problema de saúde pública, outro tema vem à tona especialmente neste 5 de maio, o Dia Nacional do Uso Racional de Medicamentos: a resistência antimicrobiana RAM), um inimigo silencioso e crescente.
Após quatro décadas de uso contínuo do mesmo esquema terapêutico contra hanseníase — a poliquimioterapia (PQT), composta por rifampicina, dapsona e clofazimina — o surgimento de cepas resistentes preocupa a Sociedade Brasileira de Hansenologia (SBH). “Antibióticos precisam ser atualizados, o que não ocorreu com a medicação para tratamento da hanseníase. A detecção de cepas de Mycobacterium leprae resistentes a uma ou mais drogas da PQT já foi identificada no Brasil e em diversos países e é uma ameaça real à eficácia do tratamento atual, podendo comprometer a cura dos pacientes, prolongar a transmissão da doença e aumentar o risco de sequelas irreversíveis”, explica o presidente da SBH, Marco Andrey Cipriani Frade.
A SBH tem alertado autoridades sobre dados preocupantes de casos de falência de tratamento contra a hanseníase – pessoas que ainda apresentam bacilos vivos no término do tratamento. Pacientes paucibacilares (com poucos bacilos) são tratados por seis meses e os multibacilares recebem a PQT por 12 meses.
O Mycobacterium leprae, causador da doença, afeta os nervos, causando inflamação que compromete movimentos das mãos, pés, pode levar à perda parcial ou total de sensibilidade ao frio ou calor, ao toque e mesmo à dor. Quando afeta os nervos do globo ocular, pode comprometer a visão e cegar. “O tratamento precoce com drogas mais eficazes é fundamental para evitar sequelas”, diz Cipriani Frade.
A racionalidade no uso de medicamentos não se limita à prescrição consciente, mas também à urgência de substituir esquemas terapêuticos obsoletos e desenvolver novas opções farmacológicas para a hanseníase.
Diante desse cenário, a SBH tem defendido um protagonismo do Brasil no desenvolvimento de novas drogas, já que o país possui sólida base científica e tecnológica, além de indústria farmacêutica capaz de entregar ao mercado novos medicamentos com baixo custo e adaptados à realidade do SUS.
A substituição ou complementação da PQT com novos esquemas terapêuticos poderá interromper a cadeia de transmissão da hanseníase e reduzir os impactos da resistência medicamentosa. Além disso, o desenvolvimento de medicamentos nacionais fortalece a soberania científica e sanitária do Brasil.
O presidente da SBH diz que, apesar dos esforços na identificação de novos casos da doença, a luta contra a hanseníase enfrenta vários outros desafios, sendo o preconceito, a falta de formação nos cursos superiores da área da saúde, a ausência de capacitação contínua e o treinamento deficiente da Atenção Básica algumas das grandes barreiras à eliminação da doença como problema de saúde pública.
O que é RAM
A RAM ocorre quando micro-organismos, como bactérias, vírus, parasitas ou fungos, sofrem alterações ao serem expostos a antimicrobianos (antibióticos, antifúngicos, antivirais, antimaláricos ou anti-helmínticos) e tornam-se resistentes a eles. O uso indiscriminado de medicamentos é um dos principais causadores da RAM.
Por ano, no Brasil, a RAM é responsável por cerca de 34 mil óbitos, mais de 220 mil mortes por infecções bacterianas e outros 400 mil casos de sepse ou septicemia (infecção generalizada), segundo o Ministério da Saúde.
O Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde de 2024 cita publicação da respeitável The Lancet de 2022 que estimou 4,95 milhões de mortes atribuídas à RAM e 1,27 milhões de mortes associadas a infecções por micro-organismos resistentes a medicamentos em 2019 – o estudo analisou 204 países e territórios naquele ano. E ainda destaca que a cada cinco mortes uma ocorreu em criança com menos de 5 anos de idade.
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