PROJETO

Entre agulhas e memórias: Ponto de Contato costura novas histórias no litoral paulista

Em fase de mentoria, projeto reúne 15 artistas e artesãs da Baixada Santista em encontros híbridos de criação, escuta e afeto coletivo

21/10/2025 - terça às 18h00

 O projeto "Ponto de Contato: Diálogos com a Tradição do Bordado em Santos", idealizado pelo artista visual Julian Campos, está em plena fase de mentorias híbridas, conectando tradição e contemporaneidade a partir do bordado. A etapa, que se estende de setembro a novembro, reúne 15 pessoas artistas e artesãs da Baixada Santista selecionadas por chamamento público, em encontros que unem prática, reflexão e memória.

Realizadas no Instituto Procomum, em Santos, e também de forma on-line, as atividades funcionam como espaços de troca e experimentação coletiva. A proposta é fortalecer o bordado como linguagem artística e herança cultural viva  um território em que se entrelaçam técnica, poética e ancestralidade.

Segundo Julian Campos, que também é um dos mentores do projeto, a cada encontro, "o que se forma é um grande tecido coletivo, bordado por mãos e histórias diversas, unidas pela vontade de criar e se reconhecer nesse fazer", explica.

Ele conta que as mentorias têm revelado histórias expressivas — de quem aprendeu com as Bordadeiras do Morro do São Bento, em Santos, de quem aprendeu a bordar com a mãe em casa, de quem encontrou no fio um refúgio e de quem vê nessa prática uma forma de resistência e poesia. "É bonito perceber que o que nos une aqui não é apenas a técnica, mas o afeto e a escuta", destaca.

Quem participa

As participantes selecionadas representam um recorte diverso e expressivo da produção manual e artística da região. Foram escolhidas pessoas que trazem diferentes trajetórias e olhares sobre o bordado: Carol Pachioni, Elissangila Maçã, Fernanda Câmara, Kelly Alonso Braga, Letícia Passarelli, Lorrany Passos, Magda Ribeiro, Marcella Santos, Maria Carmina, Malu Oliveira Rodrigues, Nika Neves, Nina Bacil Fuzetto, Rita Sales, Sheila Mattar e Sylvia Rodrigues.

Durante a mentoria, cada participante desenvolve um projeto autoral em bordado, experimentando técnicas, materiais e narrativas visuais próprias. O grupo é acompanhado de perto pelos mentores e convidado a refletir sobre o papel do bordado na arte contemporânea, na memória coletiva e no cotidiano.

Verbo Nostro Comunicação Planejada

Mentorias em andamento

O cronograma segue até novembro, sempre às quintas-feiras. Os encontros presenciais acontecem no Instituto Procomum, enquanto os virtuais contam com a participação dos artistas Rick Rodrigues e Paulo Rezende.

As participantes recebem uma bolsa de R$ 3.500 para o desenvolvimento de seus trabalhos autorais e participação nas etapas presenciais e on-line — incentivo que assegura condições para pesquisa, aquisição de materiais e dedicação às criações.

As mentorias são conduzidas por Julian Campos e pela educadora e ativista Luciana Arruda, que utilizam o bordado como ferramenta de diálogo, formação e transformação social. Os convidados Rick e Paulo, que participaram da primeira fase do projeto, retornam agora para compartilhar novas abordagens poéticas e técnicas sobre o fazer manual.

O foco é bordar o presente com os fios da memória, reativando saberes ancestrais e costurando novas narrativas no tecido urbano e afetivo da Baixada Santista.

Aprendizado coletivo e criação compartilhada

Mais do que um processo formativo, as mentorias se consolidam como um espaço de escuta e criação compartilhada. Em cada encontro, as pessoas participantes apresentam o andamento de seus trabalhos e recebem comentários e direcionamentos tanto dos mentores quanto do próprio grupo, num processo horizontal de troca e aprimoramento.

"A mentoria é um olhar conjunto. Ninguém quer chegar ao mesmo lugar — cada pessoa tem seus próprios objetivos, e o grupo ajuda a aperfeiçoar esse caminho. Durante os encontros, as participantes mostram o que estão desenvolvendo, e disso surgem as discussões, observações e comentários que fazem cada trabalho crescer. Esse olhar coletivo é o que dá força à proposta", explica Campos.

Além das orientações técnicas — sobre pontos, materiais e poética individual — o processo inclui referências do universo do bordado, do design e da ilustração. Para o artista, a experiência tem provocado uma reflexão mais ampla sobre o sentido comunitário da criação artística. "Mais do que aprimorar o trabalho de cada pessoa, a mentoria desperta um senso de comunidade criativa. Essa ideia de coletividade é essencial para fortalecer o trabalho individual e reativar um circuito de arte e de bordado que já foi muito presente em Santos. O projeto quer reavivar essa memória e mostrar que ela pode ser retomada de novas formas, com novos gestos e olhares", conclui.

O que vem pela frente

A etapa de mentorias culminará em exposições coletivas com os trabalhos desenvolvidos pelo grupo, previstas para o final de novembro e dezembro, em espaços culturais de Santos. O objetivo é reafirmar o compromisso do projeto com a valorização da produção local e o reconhecimento do bordado como expressão artística contemporânea.

Além das exposições, o projeto seguirá ativo nas redes, compartilhando vídeos, entrevistas e registros das Bordadeiras do Morro do São Bento, grupo histórico que inspirou toda a pesquisa de Julian e motivou o resgate dessa tradição afetiva e estética.

Memória viva do bordado em Santos

A pesquisa que originou o projeto parte do legado das Bordadeiras do Morro do São Bento, grupo formado por mulheres vindas da Ilha da Madeira, em Portugal, que desde a década de 1950 transformaram o bordado em uma expressão de pertencimento, fé e resistência cultural em Santos.

Essas mulheres trouxeram consigo técnicas minuciosas de ponto cheio e recorte, reconhecidas por sua delicadeza e precisão, e criaram uma rede comunitária que chegou a reunir centenas de bordadeiras nos anos 1960.

"Bordar era sustento, mas também laço — uma forma de trocar saberes e reafirmar identidade em um novo território. Com o passar do tempo, a tradição enfraqueceu e o grupo se reduziu até restar apenas Dona Teresa Gonçalves Pestana, hoje com 88 anos, considerada a última representante ativa desse ofício", lembra Julian Campos.

O projeto nasce dessa escuta atenta e propõe, mais do que preservar uma memória, reabrir caminhos para que esse saber ancestral encontre novas linguagens, novas mãos e novos sentidos na arte contemporânea.

"O Ponto de Contato é um gesto simbólico: costurar o passado ao presente, fortalecendo uma rede de bordadeiras e bordadeiros que continua a tecer identidade, memória e pertencimento no litoral paulista", resume o artista.

SERVIÇO

Mentoria do Projeto Ponto de Contato – Diálogos com a Tradição do Bordado em Santos

Período: setembro a novembro de 2025

Locais: Instituto Procomum – Rua Sete de Setembro, 52, Vila Nova, Santos/SP + encontros on-line

Mentores: Julian Campos, Luciana Arruda, Rick Rodrigues e Paulo Rezende

Participantes: 15 artistas e artesãs da Baixada Santista (cada uma com bolsa de R$ 3.500)

Redes sociais: @redepontodecontato

Próximos encontros:

16 de outubro (quinta-feira) – Encontro presencial, das 14h às 17h, no Instituto Procomum

23 de outubro (quinta-feira) – Encontro on-line, das 14h às 18h, com Paulo Rezende

30 de outubro (quinta-feira) – Encontro presencial, das 14h às 17h, no Instituto Procomum

6 de novembro (quinta-feira) – Encontro on-line, das 14h às 18h, com Rick Rodrigues

13 de novembro (quinta-feira) – Encontro presencial, das 14h às 17h, no Instituto Procomum

20 de novembro (quinta-feira) – Encontro on-line, das 14h às 18h

27 de novembro (quinta-feira) – Encontro presencial de encerramento, das 14h às 17h, no Instituto Procomum

Obs. Programação sujeita a alterações comunicadas previamente às participantes.