EDUCAÇÃO

Professora deficiente visual inspira gerações com dedicação e perseverança

Rogéria Valim, da rede municipal de São Vicente, supera desafios e reforça a importância de acreditar no potencial de cada aluno

09/10/2025 - quinta às 15h00
Atualmente na Unidade Educacional Mário Covas (Parque das Bandeiras), a professora reconhece que ainda há poucos profissionais especializados em deficiência visual e faz questão de compartilhar seus conhecimentos com colegas - Divulgação

Determinada, sensível e apaixonada pela educação. Assim é Rogéria Aparecida Valim, de 50 anos, professora de educação especial da rede municipal de São Vicente desde 2013. Cega de nascença, ela transformou as próprias dificuldades em combustível para inspirar estudantes e colegas, tornando-se um exemplo de superação e dedicação à docência.

A trajetória de Rogéria começou com um sonho diferente: ser advogada. Mas foi ao ajudar amigos a aprender pela internet que descobriu sua verdadeira vocação. "Eu explicava as coisas com paciência, e alguém me perguntou por que eu não estudava para ser professora", relembra.

Aplicada nos estudos, Rogéria passou a maior parte da vida no Lar das Moças Cegas, em Santos. "A dificuldade financeira da minha família era grande, e minha mãe, que trabalhava como faxineira, me colocou no Lar, quando ainda havia o internato. Saía de lá apenas para ir para a escola", conta a docente, que ia para casa apenas nos finais de semana. "Minha mãe tomou essa decisão para o meu bem, e foi ótimo o tempo que fiquei no Moças Cegas. Aprendi muito lá", completa.
A lembrança da antiga mestra, professora Iara, foi o impulso que faltava. "Ela foi minha grande inspiração. Tinha paciência, sinceridade e acreditava nos alunos".
Já adulta, trabalhou como telefonista, e ingressou na faculdade aos 33 anos. Enfrentou obstáculos, mas encontrou apoio nos colegas e professores. Gravava aulas, fazia provas orais e usava o notebook para acompanhar o conteúdo. "Não foi fácil, mas nunca pensei em desistir", afirma.

Até 2021, Rogéria atendeu alunos com deficiência intelectual e Transtorno do Espectro Autista (TEA). Mais recentemente passou a contribuir com deficientes visuais, inclusive na alfabetização, como uma menina que aprendeu Braille aos 9 anos. "Ver o desenvolvimento dessa aluna foi uma das maiores alegrias da minha vida", conta emocionada.

Atualmente na Unidade Educacional Mário Covas (Parque das Bandeiras), a professora reconhece que ainda há poucos profissionais especializados em deficiência visual e faz questão de compartilhar seus conhecimentos com colegas. "Quero ensinar Braille a outros professores. Há muitas crianças com potencial que não podem ficar esquecidas", ressalta.

Com o apoio das tecnologias assistivas, sua rotina tornou-se mais acessível. Hoje, utiliza aplicativos que leem textos, descrevem imagens e identificam cédulas. "Antes só existia o Braille. Agora, a tecnologia nos permite enxergar de outras formas", explica.

No Dia dos Professores, Rogéria deixa uma mensagem de persistência a todos os educadores. "É fácil desistir quando olhamos para as dificuldades, mas o foco precisa estar no aluno. A vida é feita de desafios, e enfrentá-los é o que nos torna realmente professores".

Neste 15 de outubro, Rogéria tem motivos em dobro para celebrar: além de homenagear sua profissão, ela também comemora o Dia Mundial da Bengala Branca, data que simboliza a autonomia e a independência das pessoas com deficiência visual. Trata-se de um dia especial para lembrar que a bengala é mais do que um instrumento de locomoção — é um símbolo de liberdade, inclusão e coragem, como reflete a professora, que carrega em sua trajetória o exemplo vivo de que ensinar é, também, abrir caminhos para enxergar o mundo com outros olhos.

 Renato Pirauá