Felipe Sampaio
16/10/2025 - quinta às 12h36
A relação entre o mercado e a mudança climática se encaixa perfeitamente na moral da história contida na fábula nº 87 do escritor grego Esopo – “A Galinha dos Ovos de Ouro”. Se você tem uma fonte de riqueza com perspectiva promissora no médio e longo prazo, não se precipite em extrair todo o ganho de uma vez. A fonte pode colapsar e seus planos escorrerem de água abaixo.
Não é possível garantir que todas as fábulas atribuídas a Esopo sejam realmente de sua autoria, considerando-se que ele viveu há 2.500 anos. Mesmo assim, suas lições valem até hoje. No caso dos negócios em ritmo de antropoceno, por exemplo, a galinha em questão é o próprio planeta Terra.
É nesse ponto que entra o conceito de ESG – Environmental, Social and Governance (práticas ambientais, sociais e de governança). O termo ganhou forma e fama depois que o então Secretário Geral da ONU Kofi Annan puxou a orelha de 50 CEOs de instituições financeiras em uma conferência há duas décadas atrás. Se Esopo estivesse lá, teria dito “quem cuidar da galinha ganhará ovos de ouro”. A expressão ESG viralizou com a publicação do relatório “Who Cares Wins” (Pacto Global / Banco Mundial, 2004). O título do documento é autoexplicativo – “quem cuida vence”.
Notem que ESG não é “coisa de ativista ambiental”. É uma expressão consolidada e adotada pelo escalão superior de bancos, fundos de investimentos, bolsas de valores, agências de risco e empresas de todos os setores. Não é uma ideia anticapitalista. Pelo contrário, é um olhar atualizado sobre a incerteza e as expectativas que redefinem os padrões de viabilidade dos negócios.
Segundo a gigante da tecnologia TOTVS, o ESG é uma nova forma de compreender o mercado, baseada em pilares como “Segurança do investidor, Competitividade e Reputação”. Dito de outra forma, as organizações amparadas por novas tecnologias e novos métodos, preparadas para as adaptações climáticas e seus impactos sobre a sociedade e a sua cadeia de fornecimento, são mais resilientes e conquistam níveis de confiabilidade elevados diante dos investidores, do governo, clientes e demais stakeholders. “Podemos perceber um maior engajamento dos investidores e de importantes fundos de gestão globais, cobrando um posicionamento mais concreto a esse respeito”.
Na mesma linha, a Morgan Stanley recomenda valorizar a influência de fenômenos ESG nas análises de resultados financeiros, seja no agregado dos setores, seja para empresas individualmente. “Os investidores estão, cada vez mais, se afastando da pergunta se ESG pode agregar valor às suas estratégias, e se voltando para questões de como e onde”. Tais análises consideram impactos no fluxo de caixa, lucratividade, preços de ações, spreads, riscos específicos e seleção de investimentos, como demonstra o relatório “Comparing Risk and Performance for Absolute and Relative ESG Scores” (MSCI, 2020).
As ferramentas e estratégias para ESG são especialmente importantes em setores com pegada ambiental relevante, como a mineração, o agro e o energético. Mais ainda nos mercados do Sul Global, onde as transformações sociais e econômicas resultantes das dinâmicas do clima mostram-se mais agudas para as populações, biomas e infraestrutura. Aqui, os negócios e investimentos privados pesam ainda mais como atores – ativos e passivos – dos fenômenos climáticos. Tentar prosperar (ou sobreviver) isoladamente nesse cenário é como abrir a galinha dos ovos de ouro, na qual não encontrarão nem lucros nem bônus.

Felipe Sampaio: Cofundador do Centro Soberania e Clima; atuou em grandes empresas, terceiro setor e organismos internacionais; foi empreendedor em mineração; dirigiu a área de estatísticas do Ministério da Justiça; ex-diretor do Instituto Pandiá no Ministério da Defesa; foi subsecretário de Segurança Urbana do Recife.
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